Pular para o conteúdo principal

DIREITO CIVIL - CONTRATOS

Compra de bens ou serviços para incrementar negócios da empresa não configura relação de consumo

A atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhece a existência da relação de consumo apenas quando ocorre destinação final do produto ou serviço, e não nos casos em que o bem comprado seja utilizado para outra atividade produtiva. Para que o consumidor seja considerado destinatário econômico final, o produto, serviço adquirido ou utilizado não pode ter qualquer conexão, direita ou indireta, com a atividade econômica exercida pela empresa compradora. A destinação final só ocorre quando o produto ou serviço é adquirido para o atendimento de uma necessidade própria, pessoal do consumidor. Assim entendeu a Terceira Tuma do STJ, ao negar provimento ao recurso especial da Intermaq Interamericana de Máquinas Ltda. contra a Viação São Cristóvão Ltda.

A Intermaq, empresa revendedora, importadora e exportadora de maquinários sediada no Paraná, entrou na Justiça com um pedido de indenização contra a Viação São Cristóvão, devido a um contrato firmado com a transportadora para levar um gerador de energia da sede da fábrica, em Cravinhos (SP), para Belo Horizonte (MG). De acordo com a empresa compradora, o produto teria sofrido avarias devido às más condições no deslocamento. A Intermaq pretendia que a empresa de transporte pagasse cerca de R$ 12 mil, corrigidos desde a data da celebração do serviço com a São Cristóvão (2002).

O juiz de primeiro grau entendeu que o processo discutia uma relação de consumo e aplicou o artigo 101 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), o qual prescreve: “Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços, sem prejuízo do disposto nos Capítulos I e II deste Título, serão observadas as seguintes normas: I – a ação pode ser proposta no domicílio do autor (no caso, da Intermaq)”.


Inconformada, a Viação São Cristóvão recorreu à segunda instância, alegando não se tratar a questão de relação de consumo, uma vez que a empresa não era consumidora nem hipossuficiente, sendo aplicável, portanto, o artigo 100 do Código de Processo Civil, que estabelece como foro competente para julgar a ação o da sede da pessoa jurídica demandada (no caso, Divinópolis (MG)).

O Tribunal de Alçada do Paraná deu provimento ao recurso da Viação São Cristóvão, alegando não ser possível aplicar o CDC, “por se tratar de relação de insumo, visto o tipo de atividade contratado: transporte para entrega de produto vendido. Competência do foro da sede da demandada”. Com a decisão desfavorável, a Intermaq apelou ao STJ, sustentando violação ao CDC. A defesa da empresa argumentou que, para a definição de destinatário final, não importa o que será feito com o produto transportado ou por quem será utilizado, mas sim quem é o consumidor do serviço de transporte. Desse modo, a relação estabelecida entre a empresa e a Viação São Cristóvão seria de consumo, razão por que a ação indenizatória poderia ser ajuizada no foro do domicílio da própria Intermaq.

O relator do processo, ministro Sidnei Beneti, não acolheu os argumentos em favor da Intermaq. Para ele, está correto o entendimento do Tribunal de Alçada do Paraná, que entendeu não haver relação de consumo, mas apenas um contrato de transporte com a finalidade de atender a uma solicitação de compra de um dos clientes da empresa revendedora. “Resta evidente que a atividade de revenda da agravante (Intermaq) inclui, normalmente, o transporte das máquinas e equipamentos até o domicílio ou sede do cliente – comprador; este sim, consumidor ou destinatário final, tanto do produto, como do transporte deste”, destacou.

Benetti esclareceu que a aquisição de bens ou a utilização de serviços, por pessoa natural ou jurídica, com o objetivo de implementar ou incrementar os negócios, não podem ser vistos como relação de consumo, e sim como uma atividade de consumo intermediária. “Se assim não fosse, o microssistema do Código de Defesa do Consumidor deixaria de ser especial, sua tutela jurídica deixaria de ser diferenciada e, portanto, a generalização faria desaparecer o próprio fundamento dessa lei de proteção especial, passando a ser o conjunto de normas a regular todos os contratos”, concluiu.

O ministro negou provimento ao recurso especial, sendo acompanhado pelos demais ministros da Terceira Turma.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Processo Civil IV - Execuções

Penhora on line de dinheiro de empresa para pagar honorários advocatícios em execução que já dura quatro anos Decisão do TJRS manteve o bloqueio de R$ 39.593,38 na conta corrente da empresa Pedreira Vila Rica Ltda. A penhora on line foi autorizada, em primeiro grau, na ação de execução de sentença relativa à cobrança de honorários advocatícios devidos a Mello & Mello Advogados e Associados, exeqüente.A Pedreira Vila Rica Ltda. agravou da decisão do juiz da 15ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, que indeferiu o pedido de desbloqueio da quantia. A executada-agravante sustentava "não ser admissível a penhora sobre dinheiro", ponderando também que "o montante seria utilizado para o pagamento da folha dos funcionários".Negando seguimento ao recurso, a desembargadora Helena Ruppenthal Cunha, da 16ª Câmara Cível do TJRS, salientou que a Lei nº 11.232/2006 permite a penhora eletrônica, na forma do art. 655-A do Código de Processo Civil. Para a relatora, ao con...

Processo Civil IV - Execuções

Impugnação na fase de cumprimento de sentença passa a pagar custas judiciais Surpresa para partes e advogados a partir de janeiro de 2008: serão devidas custas processuais em mais dois momentos: a) na fase de cumprimento de sentença (Livro 1, Título VIII, Capítulo X, do CPC), na data do requerimento, pelo credor, de expedição do mandado de penhora e avaliação; b) também na fase de cumprimento de sentença, quando ocorrer a impugnação prevista no art.475-J, § 1°, do CPC.A obrigação ao desembolso vem expressa na lei estadual (RS) nº 12.765. A norma - que tramitou a partir de projeto sem que a OAB/RS e os advogados fossem ouvidos - foi sancionada pela governadora Yeda Crusius em 04 de setembro de 2007 e "altera disposições da Lei nº 8.121, de 30 de dezembro de 1985, Regimento de Custas, e da Lei nº 8.960, de 28 de dezembro de 1989, que dispõe sobre a Taxa Judiciária".A lei tem um vício formal ao dispor (art. 6º) que "entra em vigor na data de sua publicação" - ocorrida ...

PRÁTICA FORENSE

Ministra Ellen Gracie arquiva processo por falta de clareza e objetividade da petição Por considerar “ininteligível” a Petição (PET) 3794, a ministra Ellen Gracie negou seguimento ao pedido, ajuizado no Supremo Tribunal Federal (STF) por um advogado, em defesa própria. A petição alega a existência de violação a várias leis e tem como requeridos Itamar Franco, o Congresso Nacional, o Tribunal de Justiça de São Paulo, o 15º Ofício de Imóveis da Capital, o Instituto de Previdência estadual, a Santa Casa de Misericórdia e a Assembleia Legislativa. Em sua decisão, a ministra cita trechos do pedido e ressalta que “em extensa e ininteligível peça, o requerente adjetiva dizeres desconexos, desordenados e impertinentes, sem ao menos dar a conhecer sobre o que litigaria nem qual o fundamento jurídico de seus interesses processuais”. A ininteligibilidade da petição impõe o reconhecimento de sua inépcia, conforme dispõe o artigo 295 do Código de Processo Civil, frisou a ministra. Ao determina...